Estatuto da Criança e do Adolescente ajudou país a avançar na universalização do ensino
Apesar de avanços, desigualdade social deixa 88 mil fora da escola
Entre os principais avanços conquistados no país nos últimos 30 anos, desde que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) foi publicado, está o crescimento dos percentuais de crianças e adolescentes na escola.
Segundo o Relatório do 3º Ciclo de Monitoramento do Plano Nacional de Educação (PNE) 2020, 98,1% da população de 6 a 14 anos frequenta ou já concluiu o ensino fundamental, e 73,1% dos adolescentes de 15 a 17 anos frequentam ou já concluíram o ensino médio.
O relatório faz um acompanhamento do cumprimento das metas do PNE e aponta que alguns objetivos que deveriam ter sido cumpridos em 2016 ainda não foram alcançados. É o caso do percentual de crianças de 4 a 5 anos em escolas ou creches, que está em 93,8% e já deveria ser de 100% há quatro anos.
Outras metas que precisam ser cumpridas até 2024 ainda requerem um longo caminho, como o percentual de crianças de até 3 anos em creches, que precisa chegar a 50% e estava em 35,7% em 2018, ano do último resultado disponível. Outro exemplo é o percentual de adolescentes de 16 anos com o ensino fundamental concluído, que está em 78,4% e precisa chegar a 95%.
Diferenças regionais
Os números gerais sobre um país como o Brasil, no entanto, escondem desigualdades regionais, de renda e de raça, alerta a diretora de relações institucionais da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, Heloísa Oliveira. Segundo o Anuário da Educação Básica, do Movimento Todos pela Educação, apesar de 99,7% das crianças e adolescentes de 6 a 14 anos estarem na escola, a parcela excluída não é pequena e chega a 88,6 mil em números absolutos. Quando dividida a renda dos domicílios brasileiros em quatro grupos, o percentual de jovens de 16 anos que concluíram o ensino fundamental é de 95,1% entre os mais ricos e de 69,1% entre os mais pobres.
“Quando a gente abre essa informação, esse é o grande problema que a gente tem na educação, é a forma como as desigualdades sociais permeiam esse direito. Essa média é composta por diferentes realidades”, avalia a pesquisadora, que exemplifica que a meta de matricular 50% das crianças de até 3 anos em creches já foi atingida para as famílias mais ricas, que alcançaram 51%, mas ainda está bem distante do ideal nas mais pobres, com cerca de 29,2%. Já na faixa de 4 e 5 anos, enquanto a média nacional já passou dos 90%, e o Ceará atingiu 98,5%, no Amapá, o percentual era de 67,8% em 2018, o menor desde 2012.
Educação infantil
A busca pelos percentuais de universalização do ensino na educação infantil, sua inclusão na educação básica e até o estabelecimento de metas no PNE fazem parte da herança do Estatuto da Criança e do Adolescente, que entre outros avanços foi base para o Marco Legal da Primeira Infância, em 2016. “É um reflexo dessa discussão da criança como sujeito de direitos. Quando a creche era da assistência social, era um espaço de cuidado. Na educação, a creche é um espaço de desenvolvimento. É uma mudança importante”, diz Heloísa.
O desenvolvimento é percebido com clareza pela copeira Brenda Cristina de Oliveira, de 27 anos, que conseguiu matricular as três filhas em creches públicas do Rio de Janeiro. Hoje, na escola, as meninas têm bom desempenho, porque saíram da creche “mais espertas”, comemora a mãe.
“A criança que frequenta a creche consegue largar a fralda mais cedo, juntar as palavras melhor. Quando a criança não é da creche, parece que tem menos idade”, conta ela, ao lembrar de outra criança na família que não conseguiu vaga. “Ele teve muita dificuldade no primeiro ano, chorava muito, não queria ficar, teve dificuldade de aprender, coisas que minhas filhas não tiveram.”
O direito a que suas filhas tiveram acesso, porém, ainda exclui muitas pessoas no seu bairro, Lins de Vasconcelos, na zona norte do Rio de Janeiro. “Onde moro, é o que mais tem [crianças sem creche]. São muitas crianças e poucas creches. Muita gente não consegue.”
Qualidade do ensino
Para Heloísa, além das desigualdades, a educação brasileira ainda tem que superar o desafio da qualidade. A avaliação coincide com a do Instituto Nacional de Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira (Inep), que apontou no último dia 2 que o baixo nível de aprendizado dos alunos, as grandes desigualdades e a trajetória escolar irregular estão entre as questões mais preocupantes em relação à educação pública brasileira.
O anuário do Todos Pela Educação mostra que, de cada 100 estudantes que ingressam na escola, 78 concluem o ensino fundamental antes dos 16 anos, e 65 chegam ao fim do ensino médio antes dos 19. Ao final da educação básica, apenas 29,1% têm aprendizagem adequada de língua portuguesa, e 9,1%, de matemática.
Confira o especial da Agência Brasil:
http://conteudo.ebc.com.br/agencia/2020/eca_30anos/eca30anos.html
Fonte/Fotos: Agência Brasil