Bolsonaro e a Rainha da Inglaterra

Bolsonaro e a Rainha da Inglaterra

  O presidente da República, Jair Bolsonaro, vem sendo comparado à Rainha da Inglaterra. Qual a razão, a origem histórica dessa comparação? A expressão “Rainha da Inglaterra” é usada para um governante que tem a pompa do cargo mas não tem o poder efetivo. É o que acontece com a Rainha (ou Rei) da Inglaterra, que tem o título real mas de fato não governa.

  A origem disso está na Revolução Inglesa, que começou em 1642 e acabou em 1649. Ao final desta guerra civil o Parlamento assumiu o poder de fato e esvaziou o poder real. Na prática quem governa desde então é o Primeiro-Ministro, eleito pelo Parlamento, e que indica os membros do governo. A Rainha apenas sanciona as Leis aprovadas pelo Parlamento. Segundo o escritor Leon Trotsky, foi o espírito extremamente conservador dos ingleses que os levou a manterem uma instituição política e administrativamente dispensáveis, com alto custo para os cofres públicos.

  Bem diferente aconteceu na França, onde a burguesia – que estava em ascensão econômica e política – extinguiu a Monarquia, implantou a República e foi além: o rei Luís XVI e sua rainha Maria Antonieta foram decapitados, junto com grande parte da nobreza. Possivelmente as condições extremas de miséria a que o povo francês estava submetido na época – em contraste com o luxo da nobreza – e a brutal repressão do rei contra seus súditos – (ficou famosa a Bastilha, onde eram presos o opositores) tenham sido a causa disso.

  Na Inglaterra preferiram contemporizar, algo como o “jeitinho brasileiro”: mantiveram a monarquia, mas esvaziaram o poder real, ficando este mais como uma figura decorativa. Portanto, quando se diz, que Bolsonaro está se tornando uma “Rainha da Inglaterra”, significa que ele tem o cargo de Presidente da República, mas não pode exercer na plenitude os poderes delegados a ele pela Constituição pelas condições políticas, econômicas e sociais do momento.

  É o que sucede, por exemplo, com a novela da demissão do Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. O presidente Bolsonaro faz o contrário do que o ministro recomenda (isolamento social), diz publicamente que falta humildade ao ministro, e como aconteceu ontem, 5 de abril, mandou um recado direto dizendo que tem gente no governo que “subiu pra cabeça”, que “virou estrela”, que “fala pelos cotovelos”, que “a hora dele vai chegar”,  que “ a minha caneta funciona”. Ora, porque então o presidente não usa a caneta e o poder que tem e não o demite?

  As razões são psicosociais. O ministro é hoje bem melhor avaliado pela população que o presidente na condução da crise em que estamos por conta do coronavírus. Com a popularidade já em baixa e uma situação caótica se aproximando, demitir Mandetta neste momento pode agravar a crise do governo. Bolsonaro tem a caneta, mas reluta em usá-la, pois sabe que o uso indevido dela tem consequências.

   Pelo suceder dos fatos, é possível que Bolsonaro demita em breve o ministro da Saúde. Abundam nas redes sociais ataques de todo tipo a ele partindo dos bolsonaristas radicais e do chamada “Gabinete do Ódio”, comandado por Carlos Bolsonaro.  A situação está tomando uma proporção tal que talvez não reste a Bolsonaro outra alternativa a não ser demiti-lo, para reafirmar sua autoridade. Mas isto terá um preço alto. É provável até, que ainda nesta segunda, ou amanhã, seja anunciada a demissão. É Bolsonaro tentando retomar a autoridade perdida.

  Mas não se trata apenas de Mandetta, o vice-presidente Hamilton Mourão, e outros membros do governo, inclusive militares, sabem do momento delicado e divergem publicamente do presidente, demonstrando a perda progressiva de autoridade de Bolsonaro dentro de seu próprio governo, de que, em tese, é o chefe.

  Ressalte-se que essa perda de autoridade decorre dos próprios atos e palavras do presidente e de seus filhos, que, num curso errático, vêm pautando suas ações pela pura ideologia (de direita) e trazendo já graves prejuízos econômicos para o país.

  Bolsonaro julga-se um rei, mas não o é. E seus filhos se acham príncipes. Como entender que um vereador do Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro, assuma lugar na mesa em reuniões de ministros e tenha uma sala para si no Palácio do Planalto sendo que não tem nenhum cargo no governo? O outro filho, Eduardo Bolsonaro, tentou a todo custo se tornar o embaixador do Brasil nos Estados Unidos. Julgam que podem isso tudo pelo simples fato de serem filhos do presidente, como se Bolsonaro fosse o rei e eles príncipes. Ocorre que estamos numa República ( a monarquia foi abolida no Brasil em 15 de novembro de 1889) e temos uma Constituição e as ações da suposta “família real” estão submetidas a ela.

   Seria de bom alvitre que os Bolsonaros estudassem um pouco de História. Esta ciência é de utilidade não só para conhecermos e entendermos o passado, mas também para não repetir os seus erros. Mas História, faz parte das Ciências Humanas, e estas – de acordo com a cartilha bolsonarista – é “coisa de esquerdista”.

   Eber Benjamim (Jornalista, editor da Gazeta Trabalhista)

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