Indígenas ocupam DSEI-MS contra mudança no comando do órgão que atende a saúde indígena no estado
A alteração no comando da Dsei-MS (Distrito Sanitário Especial Indígena de Mato Grosso do Sul), oficializada na semana passada, dia 9, pelo ministro Luiz Henrique Mandetta, revoltou os índios de MS, levando-os a pressionar o Ministério da Saúde, realizando uma ocupação do órgão no Estado, que fica em Campo Grande.
O então coordenador Fernando Sousa, que é representante indígena, foi retirado do cargo, sendo substituído por Eldo Elcídio Moro, historiador e especialista em Gestão de Trabalho Pedagógico, mas não indígena. Assim, os usuários índios, não aceitam uma pessoa de fora atuar como chefe nas aldeias, mesmo que seja da área da saúde ou principalmente nesta área, que tem sua particularidade de decisões e atendimento entre os índios.
A ocupação do prédio da Dsei-MS, que fica no bairro Bandeirantes, região Oeste da Capital, tinha sido feito na semana passada, por alguns indígenas, mas que saíram sem muito tempo no local. Contudo, agora, hoje, o movimento aglutinou diversas etnias do Estado em protesto contra a exoneração de Sousa ante a nomeação de um não-índio para comandar o órgão. Eles afirmam não terem sido ouvidos no processo, bem como alegam que o indicado para o posto não preenche requisitos obrigatórios.
Conforme Flavia Arino Nunes, do Movimento Mulheres Guarani Kaiowás, estão no local ao menos seis etnias com 130 pessoas presentes, que pretendem ficar no local sem data para sair até serem ouvidos, mas sem paralisar os trabalhos do Distrito. “Ocupamos para pressionar o Governo. Somos já 130 entre Guarani Kaiowás, Terena, Guarani Nhandeva, Kinikinaua, Atikun e Kadiweus. Temos aqui representantes de várias regiões do Estado e não aceitamos um não-indígena como chefe de órgão tão importante para nós. Vamos permanecer na Dsei-MS até que seja aberta interlocução com o Ministério e a direção do órgão volte para um indígena”, afirmou.
Apesar de afirmar que não seriam paralisados serviços, a reportagem entrou no prédio, no início da tarde desta quinta-feira (17), e não havia nenhum servidor público. A única funcionária no local estava na portaria, mas sendo de empresa terceirizada, a mesma estava sem qualquer informação. “Não deixaram nenhuma informação, o prédio está aberto, que deve ser por estar ocupado pelos índios, que acham que prédio público é a casa deles e devem cuidar, que a princípio só entra com eles. Como você estava falando com eles, você entrou lá sozinho”, disse a funcionaria que não vamos identificar.
Segundo Jaqueline Gonçalves, também do ‘Mulheres Kaiowás’, a nomeação fere o decreto federal 9.727, assinado pelo presidente Jair Bolsonaro em 15 de março de 2019 e que, dentre suas previsões, estabelecem que ocupantes de cargos de Direção e Assessoramento Superior e de Funções Comissionadas do Poder Executivo, no mesmo nível da direção da Dsei, devem ter ‘experiência profissional’ de, no mínimo, três anos em atividades nas áreas de atuação do órgão ou da entidade ou em áreas relacionadas às atribuições e às competências do cargo ou da função.
“Eldo Moro chegou a ser nomeado para superintendente do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) no Estado, onde até seria seu lugar de formação. Mas, agora jogaram para cá, uma área sem relação com ele e um não índio, não sabe as necessidades da base, das crianças e dos anciãos. E uma eventual substituição demandaria consulta às aldeias e tivemos de engolir goela abaixo”, disse a líder indígena.
Governo retira servidores para causar divisão
Jaqueline afirmou que vieram fazer a pressão e farão um movimento pacifico, e que jamais querem paralisar os serviços que todos necessitam. Mas, que já de inicio querem criminalizar a ação, inventando mentiras e até tentando provocar brigas entre os próprios índios. “Viemos pressionar e dialogar ante o que não fizeram e querem já criminalizar a nossa parte. Já inventaram e chamaram a polícia (Polícia Federal) por denúncia que entramos e vandalizamos o prédio e materiais. Os policiais vieram com seu jeito e já chegaram duros, o que é para nós uma repressão e tentativa de jogar algum crime para nós. Mas, não encontraram nada do ‘denunciado’. Fizemos um acordo que entraríamos para ficar, mais nada que iria parar muito os trabalhos, que são para todos e todas nas aldeias. Contudo, hoje alguém ligou de Brasília e mandou todos saírem. Assim, querem jogar índio contra índio, pois quem ficou na aldeia e precisa vai ser convencido que paramos os atendimentos e atrapalhando a vida de todos”, argumentou a líder.
Ela revelou que até conversou mais cedo com a secretária nacional, em Brasília, mas nada foi acordado, além de que ela poderá vir a Campo Grande para verificar a situação. “Talvez a Silvia – Waiãpi , responsável pela Sesai – venha para cá nos próximos dia, semana que vem, mas nada foi acordado entre nós. Mas, lembremos que a Sesai (Secretaria Nacional de Saúde Indígena, que comanda os Dseis) é fruto da nossa luta”, afirmou ela.
Lúcio Borges