Ministério da Saúde retira covid-19 da lista de doenças de trabalho; entidades do setor de saúde e dos trabalhadores denunciam grave retrocesso

Ministério da Saúde retira covid-19 da lista de doenças de trabalho; entidades do setor de saúde e dos trabalhadores denunciam grave retrocesso

Diário Oficial da União desta quarta-feira (2) traz a revogação de uma portaria do Ministério da Saúde, publicada ontem, que incluía a covid-19 na lista de enfermidades relacionadas ao trabalho. A norma fazia parte da atualização da Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT). A última versão é de setembro de 2017. Com o recuo do governo, todas as medidas ficam sem efeito.

Segundo o governo, a medida revogada pelo ministro interino da Saúde, general Eduardo Pazuello, facilitaria que trabalhadores de setores essenciais, afastados das atividades por mais de 15 dias em razão do novo coronavírus, pudessem ter acesso a benefícios como auxílio-doença.

No mês passado, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que a contaminação pela covid-19 em ambiente de trabalho configura como doença ocupacional, podendo assim ser considerada acidente de trabalho.  Na prática, o entendimento possibilita que esses trabalhadores tenham acesso a benefícios por meio do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).

Repercussão

Entidades ligadas ao setor da saúde e aos direitos trabalhistas estão se manifestando contra a medida, considerada um grave retrocesso. Uma das entidades que divulgou nota a respeito foi a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO), pedindo a revogação da medida tomada pelo Ministério da Saúde. Veja a íntegra da nota abaixo.

Nota de repúdio – Publicação Portaria nº 2.345/MS/GM, de 02 de setembro de 2020

É com surpresa e indignação que recebemos a Portaria GM/MS nº 2.345, publicada em 02 de setembro de 2020.

Após saudar a atualização da Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT) pela na Portaria GM/MS nº 2.309, de 28 de agosto de 2020, vinte anos depois de sua primeira publicação, o pedido de revogação em menos de 24 horas nos causa perplexidade por desrespeitar todas as instâncias garantidas legalmente e que foram devidamente respeitadas no processo de atualização da LDRT.

A atualização periódica da Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho é uma das importantes atribuições do Ministério da Saúde e do Sistema Único de Saúde previstas na Lei Orgânica da Saúde (Lei Federal nº 8.080/1990). A primeira atualização ocorreu em 1999 (Portaria Federal Nº 1.339/GM – MS, em 18 de novembro de 1999), por iniciativa do Ministério da Saúde que, considerando a importância da definição do perfil de morbimortalidade da população trabalhadora para o estabelecimento de políticas públicas no campo da saúde do trabalhador, constituiu grupo de especialistas que revisou a lista anteriormente utilizada pela Previdência Social, o que constituiu um avanço e importante instrumento para toda a rede de saúde, especialmente para as ações de saúde do trabalhador do SUS. O Art. 2º desta portaria indicava inclusive que esta lista poderia ser revisada anualmente.

Após quase vinte anos da primeira lista, o  processo de atualização envolveu ampla discussão e participação social ao longo de dois anos, com discussões técnicas e consulta pública. O produto final aprovado por diversas instâncias no próprio Ministério da Saúde, com parecer jurídico favorável, apresentação na Comissão Intergestores Tripartite (CIT) e assinatura do próprio Ministro.

Destacamos a importância da atualização e da publicação da Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho, que tem sido adotada como referência dos agravos potencialmente originados nos ambientes, processos e atividades de trabalho para uso clínico e epidemiológico no âmbito do Sistema Único de Saúde. Ela orienta as equipes técnicas das redes de atenção à saúde (básica, especializada, urgência/emergência) e as equipes de vigilância em saúde, de todos os municípios e estados, para o desenvolvimento da atenção, do cuidado, das ações de promoção, vigilância, prevenção e proteção da saúde.

A LDRT-atualizada destina-se a orientar as ações de atenção integral à saúde dos trabalhadores e trabalhadoras na rede de serviços de saúde. Além do cumprimento da legislação, espera-se do o compromisso governamental para com os trabalhadores brasileiros, considerando as grandes mudanças nos processos de trabalhos, pela incorporação de tecnologias e a evolução do conhecimento científico sobre as consequências para o processo saúde-doença desse grupo populacional.

Portanto, a Portaria GM/MS nº 2.345/2020 representa um perigoso precedente aos processos democráticos que pautam a discussão sobre a saúde coletiva no Brasil, além de um desrespeito às garantias legais que devem ser preservadas.

Com informações da Agência Brasil e ABRASCO – Foto: Erasmo Salomão/Ministerio da Saúde

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